26 de fev. de 2012

Arte, Magia e Oráculos: Uma Tentativa Inicial de Começar um Projeto


Arte

Folhas, borrões e pincéis
Que da mente abrem a porta
A imaginação exorta
Rabiscos e traços fiéis
Sábio e tolo é o artista
Que sua alma revela
Refletindo em branca tela
Seus anseios e paixões
"Amai a beleza do homem"
Está é a lição antiga
Que de seu ser já faz parte
Pra que a arte seja vida
E a vida seja arte



Todo mundo tem algo em que é bom. Eu, sou particularmente bom na arte de cultivar o ócio, conheço muitas e variadas formas  de não fazer absolutamente nada, e isso já me rendeu algumas ideias bem criativas. Enfim, na arte, como na vida, todo mundo é bom em alguma de suas facetas. Você talvez seja um desastre pintando, mas pode ser bom com escrita. Pode ser um escritor de causar pena de tão ruim, mas provocar arroubos de emoção com uma escultura bem feita. Talvez não seja bom em nada disso, mas em algo simples do dia a dia, como arrumar suas HQs ou livros de RPG, ser capaz de um nível de beleza no trabalho que transcende as próprias barreiras que limitam a tarefa aparentemente chata para desaguar no vasto oceano da arte. 

A poesia acima eu fiz há alguns anos para falar exatamente de arte,  tentei colocar meu conceito de arte no papel e o que saiu foi isso. Tenho a ideia de arte como imaginação em movimento, moldando o mundo material. Por isso considero a magia como uma arte, lidar com a magia exige um nível de preparo mental e uma dedicação a seus objetivos dignos dos transes de muitos artistas famosos. Magia não é uma ciência, não pode ser medida, pesada e calculada em todas as suas grandezas, como pretenderam fazer certos estudiosos da magia equivocados. Por isso, para criar magia não precisa ler todos os compêndio clássicos das doutrinas tradicionais. Ao fazer isso você é um mero historiador da magia. A magia vai além disso, é uma emoção, um estado de consciência, uma forma de superar a condição normal do ser humano preso à realidade material. Para fazer magia, você precisa ser livre a ponto se se permitir pensar por si próprio, a ponto de se permitir liberar toda a sua imaginação e destilá-la em arte. 

Quem teve a paciência de ler até aqui deve estar se perguntando onde exatamente eu estou querendo chegar. Escrevi isso para justificar a forma de abordar dois assuntos que desenvolverei aqui no blog. O primeiro será relacionado a oráculos, irei expôr meu ponto de vista individual sobre oráculos, vários métodos, como funciona, como desenvolver, se é dom ou não. Não serão postagens meramente técnicas e sim filosóficas, procurarei discutir como funciona a divinação, a partir de minhas idéias e experiências. Nem tudo é original, e nem tudo todos irão concordar, será minha visão do assunto trazida a público, aberta a comentários, críticas e sugestões, estamos aqui para aprender em primeiro lugar. 

O segundo tema será a experimentação mágica. Pensei em abordar defesa mágica, que é um dos assuntos que mais me interessam, mas não é algo que interessa à tantas pessoas e nem todos 
possuem disposição e preparo para todos os meandros da defesa, que na forma como vejo e pratico inclui alguns conceitos bastante polêmicos aos caoistas. Enfim, procurarei trazer a vocês uma sequencia de informações sobre algumas práticas que utilizo à título de experimentações pessoais. Uma delas é um assunto chamado protocolos, que consiste basicamente no desenvolvimento de chaves e fórmulas mágicas para obter certos efeitos. 



25 de fev. de 2012

Ceifador - O que Sou?


Eu sou a gordura acumulada nas artérias do seu coração que o fará parar após anos de vida sedentária. Sou a bala que sairá do revólver e transpassará seu corpo. Sou a complicação que fará com que você jamais se levante da mesa de cirurgia. Sou o último grão de pó que te levará a overdose.

Eu sou o poste de energia elétrica em que você vai bater seu carro. Sou a faca de cozinha que sua mulher enfiará no seu peito após você pegar ela na cama com o amante. Eu sou aquele choque psíquico que te fará enfartar. Sou as chamas que consumirão sua carne naquele incêndio.

Eu sou aquela casca de banana que te fará cair e rachar a cabeça no paralelepípedo. Sou o veneno mortal que você tomará sem saber. Eu sou a lâmina afiada que romperá sua garganta, fazendo seu sangue escorrer na terra . Sou também a última facada entre aquelas vinte que você levará no abdome.

Eu sou a máquina de refrigerante que vai desabar sobre você naquele momento em que a sede será maior que a prudência. Sou o raio que entre os milhões de locais em que poderia cair resolverá vir diretamente sobre sua cabeça. Eu sou o cadarço do seu sapato mal amarrado, que te fará perder o equilíbrio e cair da escada. Sou aquele ferro com a ponta para cima que estará exatamente naquele local onde você vai tropeçar. Além disso também sou a idade naquele momento em que ela virá cobrar o maior de seus preços.
Eu sou um Ceifador. E você nunca estará totalmente preparado para mim. Eu posso ser qualquer coisa, até aquelas mais improváveis. Criatividade nunca é demais. Sem nenhuma inovação ficará muito fácil evitar-me, e assim meu trabalho tornaria-se terrivelmente chato. Como será que irei encontrá-lo um dia? Você já pensou sobre isso? Chegou a imaginar como seria? Se não imaginou, continue sem imaginar. Pois eu jamais virei da forma que você esperar. Afinal, a surpresa é a alma do negócio.

20 de fev. de 2012

Sobre Teístas e Ateus

Acreditar ou não em Deus é uma questão meramente de fé. Portanto, teísmo e ateísmo são pólos opostos em nível equivalente. A diferença básica do teísta para o ateu é a mesma que existe entre alguém que gosta de melancia e alguém que não gosta.

    Observamos atualmente, de um lado teístas que consideram ateus seres inferiores, egoístas materialistas e amargurados com a vida, pobres coitados que não tem grandeza espiritual o suficiente para notar a presença do criador em todas as coisas. Do outro lado, temos ateus que consideram teístas pobres coitados dominados pela alienação, que precisam da crença em um ser invisível para mascarar suas fraquezas e incapacidade de enfrentar os problemas da vida por conta própria. Uns consideram os outros tolos, talvez sejam ambos igualmente dotados de tal defeito.

    Podemos dizer sem medo de errar, que a questão da existência ou não de Deus nunca terá um fim, Pelo simples fato de que ambas as hipóteses são paradoxais. Antes de continuar, é preciso ficar claro que ao falar de Deus, não me refiro ao Deus judaico-cristão nem a nenhum outro em particular, e sim a um planejador inteligente da criação, seja qual for sua forma. Primeiro, suponhamos que Deus não existe. Como ficaria então a posição de quem acredita nele? A primeira e mais obvia das conclusões a serem tiradas é a de que muitos destes jogaram uma vida inteira fora, pois se Deus não existir, para que serviram todas as guerras, conspirações e massacres feitos em seu nome? Há quem não beije antes do casamento pensando agradar a Deus com tal gesto. Quanto tempo, esforço e palavras perdidas. A inexistência de um planejador inteligente da criação como acima citado, não contraria nada que a ciência descobriu até hoje, pois não existe nenhum fato no universo que não possa ser atribuído ao simples acaso, por mais inteligente e proposital que este pareça, sempre haverá a probabilidade de ter sido obra do acaso. Assim como nenhum grande fato atribuído a Deus foi provado sem deixar margens para duvidas, seja por estarem perdidos nas malhas do tempo, seja por faltarem quaisquer outros tipos de evidencias indispensáveis.

    Analisemos agora a 2ª hipótese: Deus existe. Se deus existir, se existir um grande arquiteto do universo, uma planejador inteligente, isso também não estaria contra nenhum conhecimento dominado pela espécie humana na atualidade. A ciência não consegue explicar muitos fenômenos presentes no universo, conforme citado, todos poderiam ser obra do acaso, mas nada impede que pudessem ser também obra de uma força criadora inteligente. Não temos provas de nenhuma das duas hipóteses sobre Deus, apenas evidências e argumentos. Está claro que a idéia da existência de Deus surgiu inicialmente da ignorância do homem em não saber explicar fenômenos naturais simples como trovões e a passagem do dia para a noite e essa idéia foi evoluindo a medida que as necessidades do homem mudaram, prova disso é o sucesso de denominações evangélicas neo-pentecostais que exploram a fraqueza do homem perante os apelos materiais.

    Alguém certa vez disse que a religião de uma época é motivo de risos da época seguinte. Essa é uma verdade que podemos ver confirmada através dos tempos. Os deuses de uma época são sempre vistos como infantilidade pelos que vêm depois, assim como as necessidades, usos e costumes dessa época. Na idade média, existiam pessoas capazes de dar grandes somas em troca da salvação da sua alma, hoje, as pessoas riem disso, mas fazem coisas igualmente ridículas, como dar tudo que possuem em um templo achando que Deus irá multiplicar e dá-las novamente em recompensa.

   Voltando ao assunto principal, o fato de Deus ter surgido da ignorância do homem não exclui a idéia de sua existência. Tanto é que são raros os ateus que conseguem discutir com argumentos realmente bons a existência de Deus fora do plano religioso. E isso não é um desafio, apenas uma constatação. É muito fácil refutar a existência do Deus bíblico, porém a coisa muda de figura quando o foco é alterado para uma discussão cientifica ou filosófica. E a explicação para isso é que se Deus existir, seus atos, motivações e planos estariam simplesmente acima da compreensão humana.

    Para tornar a questão mais clara, tomemos o seguinte raciocínio. Consideremos um ateu que afirma não acreditar em Deus por que não existem provas cientificas da existência do mesmo. Para a ciência provar algo, este algo precisa ser explicado em todas as suas nuances, em outras palavras, precisa ser medido, pesado e examinado de todas as formas. Ora, se Deus existir, ele é infinitamente superior ao homem em qualquer uma das qualidades conhecidas por este. Então, se a ciência o desvendar, ele se resumirá a apenas uma força que pode ser explicada através de leis constantes, como a gravidade, deixando então de ser Deus.
    Em virtude disso, se Deus não existe, isso não pode ser provado, e se existe, também não pode ser provado. Resumindo tudo, podemos dizer que tanto o teísmo quanto o ateísmo são simples questões de fé. A ciência e a razão fornecem argumentos para ambas as correntes. Um individuo que se deixasse guiar apenas pela razão e a ciência diria ao ser perguntado se Deus existe: “não sei, não há provas para nada”. Um indivíduo guiado pela fé pode dar duas respostas, “sim” ou “não”. O que dirá sim será o teísta, o que dirá não será o ateu. Aquele que se coloca fora da esfera da fé, será o verdadeiro seguidor exclusivo da razão. Se alguém assim existir, só terá certeza de uma coisa: com relação a Deus não se pode ter certeza de nada. Por uns não poderem refutar definitivamente os outros, teístas e ateístas tendem a estar sempre a travar combates de idéias, jamais um convencendo o outro de seus pontos de vista. Por serem árvores firmadas no mesmo tipo de terreno. Uma idéia que parte de certos pressupostos e evidências, sendo solidificadas pela crença direcionada para uma ou outra corrente.

19 de fev. de 2012

Meio Quilo de Medo





Perseguido. Isso mesmo, ele estava sendo perseguido. Não adiantava sua mãe e sua irmã dizerem que era tudo fantasia. Não adiantavam todos aqueles remédios que deram no sanatório após ele ter sido internado. Nada, absolutamente nada que lhe mostrassem ou falassem, iria convencê-lo de que tudo estava bem.

Tudo começou quando viu aquele cara com o facão no jardim. Era um dia como outro qualquer ele estava se arrumando para ir ao colégio, último ano, no próximo faria faculdade, estava deixando de ser um adolescente irresponsável. Foi então que ao sair do banheiro, após escovar os dentes, viu no jardim aquele homem segurando um facão e olhando para ele. Parecia um jardineiro pelas vestes e pelo próprio facão, velho e gasto. Aparentava ter uns 30 anos e naquele momento não o perturbou. Sua mãe deveria ter contratado alguém para aparar aquela grama, já não era sem tempo.

Desceu para o café. Estava meio que apressado para variar, tão apressado que quase não viu que ao invés do tigrinho simpático que deveria estar na caixa de cereal, havia uma caricatura de tigre sorrindo desdenhosamente para ele e segurando um facão, aquele facão. Seu susto foi tão grande que a cozinha ganhou uma nova e exclusiva decoração com farelos de flocos de milho por todos os lados.

Ele levantou apressado, olhou para o chão e ali estava uma caixa como outra qualquer, pulou da cadeira e correu para o carro de sua mãe, deixando com a empregada a tarefa de limpar tudo. Olhou para fora, não havia ninguém com facão nenhum, devia estar imaginando coisas, devia ser a rotina no novo colégio, malditos professores, queriam que ele passasse o ano sem se divertir, só estudando.

Sua mãe o deixou em frente a escola, já nem lembrava do ocorrido:

- Beijo filho, até mais tarde.
- Beijo mãe, obrigado.

Aula de matemática, alguém lá em cima devia estar com raiva dele para colocar logo esse matéria na primeira aula do primeiro dia da semana. Se havia uma forma pior de começar a semana além de uma aula de matemática, ele sentiria muita pena do desgraçado que a experimentasse. Sentou no fundo da sala para fazer o que sempre costumava fazer nessa aula, tirar uma soneca. Se sacanearam ele com o horário de aulas, não custava descontar um pouco.

Se soubesse o que ocorreria, jamais teria tirado aquele cochilo.

- Que coisa feia, dormindo em aula, acorde, acorde. – Ouviu o professor falar.
- Acorde, acorde, acorde, acorde.... – Foi o coro dos alunos em resposta.
- Pô, pessoal, não precisa exa...- as palavras nunca chegaram a sair da sua boca, pois quando erguei a cabeça, estava cercado pelos 45 alunos da sua sala, todos de pé e vestindo roupas surradas, assim como o professor, e cada um segurava um facão enquanto gritava para que ele acordasse.

O som de seu grito riscou sua própria alma, e talvez a partir daquele momento tenha surgido a rachadura nela que ocasionou sua loucura. Saiu correndo desvairado pela escola, gritando pra deixarem-no em paz. Parou ao se esbarrar com um dos guardas do colégio, que o segurou. Logo vieram vários colegas para ajudar a segurá-lo, ele apenas gritava, mais aos poucos foi voltando ao normal e verificou que não havia ninguém com nenhum facão por perto, seu professor estava vestindo uma roupa colorida de péssimo gosto como sempre, nada que lembrasse as roupas cinzas que vira antes. Os colegas de sala também estavam ali, olhando para ele embasbacados por não entender nada do que estava acontecendo.

Sua mãe foi chamada, levaram-no a um psiquiatra.

- O estresse o vestibular senhora, seu filho não resistiu, isso foi uma grave exteriorização da fadiga dele. Vou passar dois bons remédios que resolverão a situação. – Falava o médico  diante dele e de sua mãe.
Saíram do consultório. Sua mãe visivelmente aliviada, ele ainda aéreo por tudo que ocorrera. Era tudo tão real, como poderia ser apenas um sonho? E o homem no jardim, e a caixa de cereal? Nada parecia encaixar, mas ele confiava que os remédios iriam fazê-lo melhorar. Era com essa fé que se encontrava quando foi passando pela recepção da clínica psiquiátrica e fitou a televisão que ali ficava para os pacientes em espera assistir.

Era uma série de TV que passava. Uma família sentada a uma mesa e dizendo piadas sem sentido. Então algo chamou sua atenção, por trás da mesa, sem nenhum membro da família ver, estava o homem do jardim som seu conhecido facão, ele o encarou, e foi correspondido, aquele sorriso desdenhoso do tigre da caixa de cereal estava bem ali, na TV. Foi demais para sua mente, não conseguiu compreender aquilo, nem aceitar, então ele simplesmente parou ali, encarando a TV, sem pronunciar uma só palavra.

Seis meses no sanatório, foi isso que ganhou. E cada vez piorava mais. Agora via pessoas com o facão por toda parte, pela janela, na televisão, em reflexos no espelho, nunca se aproximavam, apenas ficavam ao longe segurando o facão enferrujado e rindo desdenhosamente para ele.

Pensou que ficaria a vida toda naquela situação, mais ainda pioraria. De alguns dias para cá todos portavam os facões. Não deixava ninguém se aproximar dele, parece que vinham quando dormia e aplicavam agulhas nele, durante o dia ninguém ousava entrar em seu quarto no sanatório. Precisava sair dali, parece que aquelas pessoas do facão o aprisionaram naquele quarto apenas para aterrorizá-lo, nem sua mãe via mais.

Durou várias semanas com as pessoas do facão olhando para ele pelo vidro da porta de seu quarto. Ou entrando e ficando paradas no portal por vários  minutos até sair. Achou que seria assim o resto da sua vida, mas um dia aquele mesmo homem no jardim, do primeiro dia, lá entrou e ficou parado olhando para ele. Ele apenas olhou com medo como sempre, sem nada falar.

- Oi. – Falou o homem em um sorriso debochado.
Ele nada respondeu, há muito esquecera como falar, apenas emitia sons guturais de horror de vez em quando, mais até esses eram raros, pois o horror ficou tão constante em sua vida que gritar de medo se tornou enfadonho.

- Vamos, fale algo, não quer me perguntar nada? – insistiu o homem.
Diante de novo silêncio, o homem voltou-se para a porta e falou:
- Sil, pode entrar, ele está pronto.

Entrou então no quarto uma criatura que mais parecia um morcego, e a visão dela mereceu um sonoro grito de horror, aquela coisa não poderia existir, o homem do facão era assustador, mas era uma pessoa, já aquilo. Parecia a mistura de um morcego com um anão deformado. Possuía cerca de um metro e meio, sua boca parecia ser na vertical e não era possível identificar nariz ou orelhas, tão o nível de deformidade. Asas de couro apodrecido lhe caiam nas costas, e não pareciam nem um pouco capazes de fazê-la voar.

- Já não era sem tempo Fregen.- Falou a criatura grotesca quando entrou. – Seis meses engordando esse aqui.
Ela então o encarou, a criatura chamada Sil. Ao mesmo tempo em que puxava das suas vestes imundas aquilo que ele conhecia muito bem. O velho facão, idêntico ao que o homem chamado Fregen carregava na mão.

- Vamos criança, olhe para mim, olhe para mim. – Gritou Sil desvairadamente enquanto sacudia a faca para ele, como se fosse atacá-lo.

Começou a gritar, mas aos poucos foi engolindo seu grito pois o terror que tomou conta do seu corpo era de tal magnitude que o fez esquecer de gritar, esquecer de se sacudir, esquecer quem era ele mesmo. Ficou em estado catatônico e apenas uma emoção continuava viva dentro dele: o medo.

- Vamos Fregen, se apresse, passe o frasco. – Falou Sil rispidamente enquanto tomava das mãos de Fregen um frasco parecido com um tubo de ensaio de prata com uma rolha de cortiça.

Sil então pulou na cama onde ele jazia inerte e cravou a faca em seu peito, abrindo seu tórax ao meio com ele ainda vivo, e puxando para fora o coração pulsando. A criatura disforme pareceu admirar por um instante o órgão que segurava com mão, e então tirou a rolha de cortiça do tubo de ensaio e cravou o facão no coração do rapaz, caputurando todo o sangue que escorreu no tubo.

Isso não durou muito tempo. Então diante de um atento Fregen, Sil voltou ao chão e entregou-lhe o facão. Sorriu contente para o tubo e pegou dentro das vestes um pequeno frasco com um líquido tão cristalino que lembrava lágrimas, pingando uma gota do tal líquido dentro do frasco com o sangue.

- E então Sil.- Perguntou Fregen.- Quanto acha que vai render?
- Pelo menos meio quilo de medo, valeu a pena o investimento. 
- E vamos vendê-lo diretamente no mercado faérico? Ou você tem algum comprador particular.
- Não seja idiota Fregen, claro que já tenho um comprador para isso. O que diriam se a gente aparecesse e colocasse meio quilo de medo a venda na mesma prateleira que a coragem e a honra?
- Tem razão. – Respondeu Fregen rindo. – eu não havia pensado em todos esses pormenores.
- Você não é bom pensando Fregen, então procure pensar pouco e agir mais, fazendo aquilo que mando, que as coisas correrão bem para nós. Agora deixe eu me disfarçar de enfermeira de novo e vamos saindo daqui. Que estou com esperanças de conseguir repassar essa mercadoria ainda hoje.

O Vampiro Taylan


Eu estava andando apressadamente pelas ruas do centro com ambas as mãos nos bolsos do casaco. Fazia frio, muito frio. Maldita hora que minha mãe me mandou pegar aquele dinheiro na casa de uma tia que mora num dos bairros mais perigosos da cidade. Sabia que aquela velha inconveniente não me deixaria sair de lá cedo, e lá estava eu, caminhando por becos escuros para chegar naquela parada de ônibus. Apesar de tudo, a situação seria suportável se não fosse aquela fome, estava sentindo o vazio dentro de mim, a necessidade estava deixando meu corpo fraco.

Era sempre assim, eu ficava um longo tempo sem sentir nenhuma vontade. Até que a fome atacava, e quando ela atacava já vinha a fraqueza. Eu sou uma pessoa doente. Precisava controlar meus horários, não devia sentir aquilo naquele momento. Um mínimo de disciplina e a história seria outra.

Cheguei à parada de ônibus. Ninguém a vista, segurei no poste para evitar cair, estava um pouco tonto. Vários carros passavam iluminando parcialmente o local onde estava, mas meu ônibus não vinha. Céus. Infernos. Só acontece comigo isso. Estava nervoso e achando que não havia como piorar a situação quando um estranho se aproximou. Era um cara moreno, bem mais alto que eu e também mais velho. A barba por fazer era visível da distancia de meio quarteirão que me separava dele. Vestia uma jaqueta jeans bem apertada no corpo. Não vi de onde ele saiu, foi como se tivesse se materializado no meio do quarteirão, e se aproximava de mim tão rápido, que parecia flutuar.

Não venha, não agora, foi só o que pensei quando ele aproximou-se ainda mais e ficou parado há 5 metros de mim, como quem também espera um ônibus. Não me olhou em momento algum.

Senti um terrível medo, não sabia quem era aquele cara, de onde veio, o que estava passando pela mente dele. Mas eu estava fraco, não tinha opção.

Olhei para minha mão, vi o sangue correndo em minhas veias. Ele continuava lá, quase de costas para mim. Senti sua energia pulsando viva, rodeando todo o seu corpo como círculos de luz incolor.

Concentrei-me no bater do meu coração, ouvi minha respiração lenta e compassada, fiz aquilo que fui ensinado a fazer. Abri a boca lentamente e inspirei apenas por ela. Aquela energia incolor oscilou, como um galho de árvore sacudido pelo vento. Inspirei novamente, senti ela se aproximando, mais uma inspiração e ela foi entrando pela minha boca, alimentando meu corpo como uma água espiritual.

O homem não se moveu, ele devia sentir algo, mas sua incredulidade jamais lhe permitiria identificar meu ataque. Suguei dele o suficiente para me reequilibrar, fui interrompido pela chegada do ônibus, no qual subi deixando-o lá, como se nada tivesse acontecido.

Eu sinto por ele, e sinto por tantos que são atacados e não sabem. Se dependesse de mim, não teria retirado nem um décimo de sua energia vital, mas não depende, eu sou Taylan, um psivamp, não tenho opção. Eu preciso disso. 

15 de fev. de 2012

O Ceifador


                 Uma ilusória dor nos joelhos me toma de assalto, fazendo com que eu me prepare para falar sobre o tempo em que não precisava me preocupar com isso, infelizmente este se encontra tão distante que não é possível lembrar de forma clara. No estado em que estou chego a imaginar se existiu mesmo esse tempo, talvez eu o utilize apenas como um incentivo para continuar a jornada.


    Esse devaneio quase me fez esquecer o objetivo, sim, o objetivo, posso sentir o cheiro dele apesar de estar ainda a uma distância considerável. Talvez o ar umedecido pela chuva seja o responsável por isso. Choveu por toda a tarde, a cidade se encontra cheia de famílias desabrigadas nas áreas pobres, em outras, particularmente na que agora caminho, as calçadas estão frias e encharcadas de água, as nuvens pesadas cobrem todo o céu, dando essa noite um clima de enterro, isso é irônico. Irônico e apropriado.

    Aproximo-me de um bar nobre, daqueles que são feitos no terceiro mundo imitando algo que existe nos paises ricos, é aí que esta o objetivo. É realmente um lugar nobre, uma ilha de imenso luxo que contrasta com tudo que se vê da porta de saída para frente. Ninguém presta muita atenção quando adentro no local, ficaria surpreso se prestassem, a discrição se encontra profundamente entranhada em meu ser e eu gosto muito disso.

    Sento-me em uma mesa afastada e observo o objetivo. Um rapaz branco alto, aparenta cerca de 25 anos, não mais, está em uma mesa com 3 amigos e duas moças, uma delas é sua acompanhante da noite, uma entre tantas que ele já teve em sua breve vida. Sua vida poderia ser definida como ideal pela maioria dos jovens de sua geração, porém a noção de vida ideal que os jovens possuem costuma ser sempre incrivelmente distorcida em prol de coisas absolutamente sem importância. Infelizmente esses jovens crescem e continuam com a mesma mentalidade, variam apenas as coisas sem importância a que dão atenção, por isso o mundo continua caminhando para a beira do abismo geração após geração.

    Ele consome um copo de bebida atrás do outro enquanto lança olhares furtivos para a jovem ao seu lado. Os amigos fazem brincadeiras e falam de esportes, dinheiro e várias outras coisas inúteis com as quais as pessoas perdem suas vidas se preocupando. É tão estranho o ser humano. Na mesma cidade a poucos quarteirões, várias e várias pessoas dormem ao relento. Crianças estão desabrigadas por causa das chuvas. A água do planeta está acabando. A comida também. Guerras sem sentido destroem vários povos e culturas por todo o mundo. E mesmo assim meu jovem e tolo objetivo está poluindo seu corpo com bebida enquanto se concentra apenas na noite de sexo que está antevendo, como se nada estivesse acontecendo, como se estivesse tudo bem. O ser humano realmente é de um sangue frio que me deixa impaciente.

    O objetivo pousa o copo na mesa e se levanta, pronto pra concretizar aquilo que havia planejado. Uma pena. Realmente uma pena. Como eu gostaria que ele tivesse sabido pelo menos um mês antes. Talvez tivesse realizado alguma coisa de relevante nesse intervalo. Mas infelizmente as coisas não funcionam assim. Levanto junto com ele e o aguardo enquanto paga a conta. Aproximo-me lentamente enquanto se apronta com os amigos para sair. Em alguns segundos seu corpo tomba pesadamente no chão assustando a todos. Abaixo-me e o toco novamente. Chamo-o pelo nome e o tomo pela mão. Ele acorda e levanta comigo enquanto todos se movimentam desesperadamente ao redor do seu corpo sem vida. Como todos os outros ele está confuso, logo a confusão se transformará em desespero, o desespero em revolta e a revolta em conformação. Tantas vezes vi isso que já perdi a conta. Sacudo uma poeira inexistente em minhas vestes e caminho noite adentro o levando para muito longe, tão distante que nem a imaginação dele consegue alcançar. E depois, depois partirei para a próxima tarefa, pois grande é a messe e muito poucos os ceifadores.

Aos Ansiosos do Caminho Mágico



Tenha paciência com o mundo e consigo mesmo
Não espere o que sabe que não poderá obter
Aprenda a caminhar com as dores e decepções
Pois elas nunca deixarão de existir
Aprenda a reconhecer os mestres e amigos que te cruzarem o caminho
Porque, embora eles nunca deixem de lhe aparecer
Cada um que passa sem que você o reconheça é perda inestimável
Lembre mais uma vez
Todo mundo é mestre de si mesmo e mestre de todas as demais pessoas
Pois até o mais simples dos seres tem algum ensinamento a ser passado
Não subestime nem aos outros nem a si mesmo
Não superestime nem aos outros nem a si mesmo
Mesmo que seus valores não signifiquem nada aos que o cercam
Continue com eles no peito
Pois a filosofia interna apenas torna-se viva ao ser praticada
E só existe de verdade ao espalhar suas sementes ao vento
Tenha calma
Pois nunca estás sozinho
Só caminha verdadeiramente sozinho aquele que se tranca dentro de si mesmo
Abra-se para a luz
Abra-se para o bem
Porque todas as maravilhosas virtudes que admiras nos grande mestres
Precisam apenas que as portas do seu ser tornem-se largas o suficiente para que possam entrar

A Dança da Criação


No início era apenas o Caos. Isso fazia tudo ser muito chato, chegando inclusive a ser considerado inapropriado para um universo tão promissor. O Caos gerava apenas mais Caos e parecia que nunca iria ter fim.  Até que, em um tempo que nosso tempo não pode precisar, o Caos finalmente resolveu por ordem nas coisas e gerou padrões. Como isso aconteceu, não se sabe, afinal não havia nenhuma testemunha além do próprio Caos, que desde que gerou os padrões se recusa a falar sobre o assunto. 

Eram três os padrões do Caos, e os mesmos não possuíam nome, afinal não existia nenhuma linguagem ainda, mas eles tinham consciência, e nessa consciência, a primeira coisa que constataram sobre o lugar onde viviam foi:

--- Poxa, não há nada para fazer aqui, isso está uma chatice.

Dedicaram-se então a pensar em uma forma de quebrar aquele terrível tédio, isso foi  a tarefa mais hercúlea que já foi desempenhada em todos os tempos, pois nem sequer o jogo de paciência existia. Até que:

--- Espere, porque não fazemos uma dança? – Perguntou um Deles.
--- Dança, o que é isso? – Interrogaram em resposta os outros dois.
--- Dança são movimentos rítmicos e planejados que se faz seguindo um padrão sonoro.
--- Legal, ótimo, perfeito. Mas... O que seria mesmo esse negócio?
--- Foi uma coisa que veio na minha cabeça agora.

Era muito difícil de explicar, porque era algo nunca antes visto, então, o padrão nº 1, que havia imaginado tudo, resolveu demonstrar.

--- Olhem, é algo mais ou menos assim :
“Aommmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmm.

--- Cantou com uma voz muito poderosa enquanto fazia alguns movimentos com os braços e pernas.

Súbito, todos se espantaram, pois sentiam que a música vibrava dentro deles, e aquilo fez algo nascer, um pequeno ponto de luz se gerou no Caos, tão minúsculo que de início mal notaram ele, mas foi se expandindo de forma espantosa, saindo do coração dos 3 padrões, de forma que eles se sentiam parte daquela luz em expansão, como um filho que acabava de nascer.

--- Ótimo --- Falaram os outros animadamente --- queremos também fazer parte disso.
--- Certo, falou o primeiro, mas temos que dividir funções, se todos fizermos as mesmas coisas, irá ficar uma bagunça, é melhor formamos tipo... UMA BANDA!

--- Banda? O que é uma Banda?

--- Esqueçam, por favor. Olhem, vamos fazer da seguinte forma, eu serei o compositor, o criador, escreverei todas as partituras e o ritmo da dança, irei fazer a dança da criação, vou criando e mostrando como se dança. Você, padrão 2, irá me acompanhar, procurando manter minha dança firme, sustentando toda a teoria que colocarei nas partituras para que as coisas não saiam dos eixos. E você padrão 3, irá prestar atenção em todos os passos da dança, para então tirar as partes que precisem ser tiradas. Fazendo a dança da destruição, onde você nos mostra como fica a dança após as modificações que resolver fazer, deixando brechas nas partituras para inserir novos passos para o padrão 2 dançar, formando novamente um todo, para novamente você corrigir. Dessa forma, a dança nunca terá fim, e ficaremos ocupados até o fim dos tempos.

--- Tempo, o que é tempo?
--- É só um dos passos de dança que acabei de criar. Enfim, entenderam tudo?
--- Sim --- Responderam os outros em uníssono.
--- Certo, então a partir de agora temos novos nomes, eu sou o Criador da dança, o 2 é o Mantenedor da Dança, e o 3 é o Destruidor da Dança.

--- Destruidor? Que nome horrível, parece que vocês fazem tudo certinho e eu venho e                 estrago tudo, quando na verdade eu vou apenas renovar constantemente a dança, para ela nunca ficar chata.
--- Tem razão, então vamos chamar você de o Transformador.
--- Eu prefiro Transmutador.
--- Que seja. Vamos começar agora então?
--- Vamos!

Então os três começaram a dançar, o primeiro som emitido como teste pelo Padrão 1, o “Aummmmmmmm”, se tornou a primeira nota constante, dessa nota, surgiram mais duas que deviam estar presentes em toda a música, a nota tempo e a nota espaço, sendo que uma era definida em função da outra, sendo até difícil imaginar como seria se o som de uma fosse emitido de forma isolada. Havia ainda outras notas importantes, que davam fundos sonoros a essas notas, a nota da luz, as 4 notas dos 4 elementos, que combinadas, geravam sons maravilhosos que iam e vinham de forma bem rápida, deixando um sopro de nostalgia nos ouvidos dos 3 padrões. Esses pequenos sons ganharam nome de acordo com sua     duração e o movimento que era feito para executar seus passos de dança, uns foram chamados galáxias, outros estrelas, outros planetas, assim como infinitas outras entonações e passos de dança que se perdiam uns dentro dos outros.

Sempre que um desses sons não estava em harmonia com os outros, ou simplesmente havia chegado o momento de seus passos de dança deixarem de ser executados, entrava em ação o terceiro padrão, que criou diversos passos de dança e sons que encobriam essas partes a serem eliminadas. O mais interessante, é que o Destruidor; ou Transmutador, como ele prefere, inseriu esses passos em movimentos que já haviam sido criados e executados pelos outros dois. Na dança do tempo, ele inseriu os ritmos do envelhecimento. Na dança da vida, ele inseriu os sons e ritmos da morte, que liberava espaço para a vida sempre se renovar.

E a dança foi crescendo e crescendo, até que, combinando várias notas, agrupadas ao redor dos movimentos dançantes da vida, surgiu a vida consciente.  Isso deixou os 3 padrões muito contentes, pois essa parte da grande dança era capaz de reconhecer a música deles, conseguiam notar a dança sendo executada por todas as partes e deram nomes a muitas coisas. A dança como um todo, chamaram de realidade, embora eles conhecessem no ínicio apenas alguns pequenos passos, seus conhecimentos foram se expandindo com a passagem do tempo, e assim o conceito de realidade se expandiu, de acordo com as novas notas e ritmos que iam descobrindo.

Foram crescendo e crescendo essas pequenas notas e ritmos, chegando a inserir pequenos movimentos na dança dos 3 padrões. Alcançando tal sucesso nisso, que muitos cometeram o erro de achar que não eram partes da dança, e sim única e exclusivamente compositores. Dessa forma, Passaram a inserir passos, notas e sons na dança, que destoam completamente da dança original, e por isso destinam-se a serem eliminados pelo Transmutador, que depois de bilhões e bilhões de anos se tornou um ótimo crítico musical.

Isso talvez esteja prestes a acontecer, e os passos de dança destruidora já podem estar sendo ensaiados. Resta esperar que essas pequenas notas que se autodenominam homo sapiens, aprendam a compor corretamente observando a música e a dança executadas constantemente ao seu redor, para assim ficarem em total harmonia com o belo ritmo dos padrões, que são tão gentis em tocarem e dançarem para todos, que devem estar incrivelmente chateados com tamanha falta de respeito.

5 de fev. de 2012

0 – O Louco




O louco ingênuo vagueia
Sem compromisso e destino
A iluminação o permeia
O que ele quer não atino