Existem muitos magistas na internet escrevendo sobre magia, cada um com seu campo de atuação, públicos diferentes. Invariavelmente quem escreve sobre magia no sentido de domínio da vontade sobre a mente também possui outras crenças, outros costumes que acabam misturados aos conceitos de magia. Assim é com praticamente todos, inclusive comigo, impossível não notar minhas orientações ideológicas, religiosas e filosóficas nos meus escritos. A Wanju é diferente, e nisso está o seu destaque. Ela pensa a magia de forma pura, magia pela magia, sem misturar com outros conceitos e doutrinas, magia como exercício da vontade, como autosuperação mental, magia como expressão criativa e artística, se manifestando através da literatura, poesia, música e etc. Isso a torna algo diferente de escritora de ocultismo ou de magista, a considero uma pensadora da magia.
Seu caráter de pensadora se reflete bastante em suas obras, principalmente nas que são explicitamente voltadas para o público ocultista, como Agracamalas e Grimório da Insolência. O pensador é aquele que organiza um sistema que explique algo, no caso, a magia, e transmita de forma prática tal sistema. Assim são os livros da autora, não explicam o sistema, jogam o leitor no meio dele, para que o sinta na própria pele e passe a por si só compreendê-lo. O problema disso são as críticas de quem não entendeu, que podem eventualmente levar a autora a achar que sua obra não alcançou o objetivo. É um efeito colateral chato, nada pior para um autor do que ninguém entender sua mensagem. A boa notícia é que não há o que entender, há o que se sentir, há o que se divertir na leitura. Há que se abrir a própria mente para criar seus próprios mundos.
Não espere em um grimório de Wanju Duli achar a fórmula para trazer o amor em 3 dias, criar super servidores e sigilos ou evocar seres ultragalacticos. Espere duas coisas, boas ideias para refletir a magia e uma grande dose de diversão com as histórias.
Dorsedem Craivita é a história de um lixeiro, que aprende uma ou duas coisas sobre magia através de um livro que seu neto estava lendo que conta a história de um bravo índio-guerreiro-mago chamado Bosque Sul, para logo em seguida desaprender e fazer tudo diferente, reaprendendo no dia seguinte e desfazendo o que fez no anterior. Algumas mensagens são bem nítidas no decorrer do livro no que tange à filosofia da magia, uma das mais claras é o fato de que procurar a ascensão mágica através da realização da vontade pode ser tido como uma coisa infantil se você considerar que ninguém sabe o que quer afinal, ninguém consegue se despir das programações sociais, religiosas, culturais e doutrinárias de todo tipo para encontrar sua vontade pura, então centralizar o mundo na sua vontade é como imaginar uma ponte sobre um rio e tentar atravessá-lo por ela. Ou para usar um ditado popular, é como cagar na gaiola e esperar que a merda cante.
Esse tipo de pensamento provocado pelos escritos da Wanju já me renderam bons textos nesse blog, bons trechos para meus livros e muitos momentos de ideias fervilhando. A menção do meu último livro, O.F.I. como fonte de inspiração muito me honra, inclusive porque o incentivo e a inspiração fornecidos pela Wanju foram essenciais para que eu começasse a publicar minhas obras. Aprendi em seus escritos que não existe forma errada ou certa de ser magista, existe a nossa forma e não devemos ter receio ou vergonha de mostrar. Assim, não tive receio de expor a teoria dos protocolos em Liber PPP ou explicar minhas idéias básicas de filosofia e prática mágica em Vias Ocultas, nem mesmo de mostrar minha visão do mundo ocultista de forma irônica e humorística em O.F.I.
Quem leu minhas obras e da Wanju sabe que são bem diferentes nossas visões da magia e nossas práticas. Considerando isso, que afirmo que Dorsedem Craivita não é um mero livro de magia do caos. É um livro para se pensar a magia, útil a qualquer um que se disponha a tal tarefa. Você que se diz um magista, já parou para pensar sobre magia? As obras de Wanju Duli são uma ótima pedida para isso. Se você concordar com a visão dela, ótimo para você, é uma forma divertida e interessante de praticar e viver. Se não, ainda assim tirará grandes benefícios da leitura, que no meu caso foi o pontapé para que eu começasse minha própria obra.
Resta então dar os parabéns à autora. Parabéns por mais esta obra Wanju e que quando você voltar aos escritos caoístas possa nos brindar com muitas outras. Porém, parabéns é pouco nesse caso. Não só pelo Dorsedem mas por todas as linhas que dedicou a pensar e fazer magia, dedico além dos meus parabéns, o meu MUITO OBRIGADO.
Uau, que resenha incrível! Você dissecou o meu livro de uma forma que nem eu mesma havia feito. Adorei redescobrir o Dorsedem através da sua minuciosa e fascinante análise. Valeu mesmo, Ian!! Também espero ansiosamente por seu próximo livro!
ResponderExcluirQue bom vê-la de volta à internet. Abração.
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